O início dos carros autónomos em Portugal deverá acontecer a partir de 2025, atingindo o seu pico em 2050, estima, em entrevista à Lusa, João Santos, co-coordenador do projecto V2X da Bosch Car Multimedia em Braga.
“Falando no caso específico de Portugal, que é o que as pessoas querem saber, quando vai ser uma realidade em Portugal”, é preciso primeiro ter em conta que é necessário haver uma infra-estrutura de quinta geração (5G) montada, salienta.
O 5G arranca este ano e está previsto, “em 2023, 70% da área de Portugal estar coberta” com a rede de quinta geração e, em 2025, 90%.
“Se juntarmos a isso certas iniciativas de países da União Europeia (UE), o projecto Vision Zero da Finlândia por exemplo, que permite reduzir para quase zero o número de acidentes ou feridos graves nas estradas, podemos dizer que devemos começar a ver o início dos carros autónomos a partir de 2025 e atingir o seu pico em 2050”, prevê João Santos.
“A Bosch tem inúmeros projectos sobre o 5G” e estes “estão espalhados pelas mais diversas localizações do mundo”. No caso, em Braga, “está a decorrer o projecto Easy Ride, que é um projecto para a mobilidade do futuro”, realizado em parceria com a Universidade do Minho e que tem um elevado foco com a tecnologia 5G”, sublinha.
O projecto Easy Ride contempla cinco sub-projectos, onde se inclui o Vehicle to X Communication (V2X), que representa toda a conectividade necessária para atingir a condução autónoma e reduzir quase para zero o número de fatalidades e feridos em acidentes rodoviários.
O projecto é focado nas várias vertentes autónomas, em que o veículo terá um cockpit inteligente de maneira a proporcionar uma viagem personalizada ao ocupante, tendo ao mesmo tempo noção do estado do próprio automóvel e do que o rodeia – ambiente, outros veículos autónomos, veículos de duas rodas, peões, entre outros – informação que é obtida através de sensores.
“Todos estes sensores geram uma quantidade de dados enorme, terá que haver uma comunicação rápida e fiável” para que se consiga “transmitir esta informação”, e “é aí que entra o 5G”, salienta o responsável.
“Neste momento já temos várias demonstrações para tecnologia, estamos a aplicar já 5G com 4G e wifi “, precisa.
ALERTAS AO CONDUTOR
João Santos aponta como exemplo os alertas que o veículo faz ao condutor, quando num cruzamento onde não se consegue ver se vêm veículos do lado esquerdo, os sensores do carro autónomo dão a indicação de avançar ou não.
Numa primeira fase, o veículo dá “alertas ao condutor”, ou seja, “ainda não há actuação activa” do carro. Mas em aplicações mais avançadas já é possível ver além de objectos, o que parece ser “muita ficção científica”, mas não é, explica.
No caso de um veículo que tem à sua frente um camião e não sabe se pode ultrapassá-lo, a aplicação já permite ao carro ter acesso a uma câmara que eventualmente o camião tenha ou infra-estruturas que tenham câmaras na zona e transmitir “a imagem em tempo real” para os displays e, assim, o condutor “saber, até mesmo com algoritmos de machine learning” se a ultrapassagem pode ser feita em segurança.
O estado actual do Easy Ride já permite manobras cooperativas, em que carros têm uma condução semi-autónoma, coordenada com outros veículos.
“Por exemplo, quando estamos numa auto-estrada e estamos na fase de aceleração e queremos ir para a estrada principal, o carro consegue fazer e receber a informação de outros veículos e consegue regular a sua velocidade para que toda esta manobra seja feita com total segurança”, aponta João Santos.
Mas também há soluções para a área industrial: um comboio de camiões (também denominado de platooning) em que todos, excepto o líder, seguem o que está na frente e os condutores “não necessitam de estar constantemente no acto de condução”.
EASY RIDE
Tal permite “o melhor descanso para os camionistas, sem contar com a eficiência energética” e a diminuição da pegada ecológica, explica o co-coordenador do projecto V2X.
“O Easy Ride é o terceiro projecto de inovação aqui presente na Bosch”, refere, dando ainda o exemplo de que, com outros elementos da equipa na Alemanha, já se consegue “ter estacionamentos autónomos”, em que a pessoa chega ao aeroporto e “só tem que largar o carro” e este “vai sozinho encontrar um estacionamento2.
E como é que se aplica estas soluções nos veículos actuais? “É como todas as tecnologias dos veículos. Por exemplo, os primeiros carros não tinham cinco de segurança e depois passaram a ter” ou “não tinham sensores de estacionamento” e “agora têm”.
“Estamos a desenvolver uma placa electrónica que vai estar embutida nos carros”, que “vai fazer parte do standard do pacote” da compra do veículo e que “vai facilitar esta comunicação com o 5G”.
Os testes decorrem nas “chamadas zonas tecnológicas portuguesas” que foram criadas “especificamente para testar este tipo de tecnologias, não só 5G, mas tudo o que sejam tecnologias revolucionárias”.
Em Braga, a Bosch conta com três veículos de teste, que são descaracterizados e têm “o propósito” de estarem autorizados para que a empresa faça modificações e implemente tecnologia.
Questionado sobre qual o impacto dos veículos autónomos no sector, João Santos é peremptório: “Vai ser uma mudança de paradigma da condução, porque o condutor não vai ter que se ocupar com o acto de conduzir”.
“De repente cria-se ali um espaço livre. Temos o primeiro espaço que é a nossa casa, temos o segundo espaço que é o nosso trabalho e agora vamos ter um terceiro espaço em que condutor – ou neste caso o ocupante, que a palavra condutor já não se aplica”- utilizará “para lazer, para ver conteúdos multimédia ou até pode ser para trabalhar”, explica.
“Eu acho que é aí que vai ser a maior disrupção no sector automóvel”, sublinha.
Em vez de tirar o carro da garagem para ir do ponto A ao ponto B, a mentalidade passará por “pedir um serviço de mobilidade para nos transportar da nossa casa para o ponto B”, antevê João Santos, que gostaria que os carros autónomos fossem já uma realidade.
E em relação ao 6G (sexta geração)? “Uma previsão a 10 anos, eu diria, em 2030 certamente iremos ter 6G com novas tecnologias e novas velocidades”.