A Índia levou a cabo uma operação secreta de deportação de 40 refugiados rohingya — 13 mulheres e 27 homens — enviando-os de volta a Myanmar, o país que os perseguiu em 2017 numa campanha de limpeza étnica que a ONU classificou como “exemplo de manual” e os EUA reconheceram como genocídio.
O caso veio à luz através de testemunhos recolhidos pela CNN junto de familiares na Índia, sobreviventes em Myanmar e dados de voos e navegação. Entre os deportados estava Asma, filha de Mohammad Ismail, refugiado em Nova Deli desde 2017. Ambos tinham fugido do massacre no estado de Rakhine.
Às vésperas do casamento de Asma, em maio de 2025, ela foi chamada pelas autoridades indianas para “dar dados biométricos” e nunca mais regressou. Dias depois, conseguiu ligar à família de um telefone emprestado: tinha sido levada de avião para as ilhas Andamão e depois embarcada, sob coação, num navio militar, antes de ser deixada em território birmanês.
O percurso foi confirmado por registos de um voo da Defence Research and Development Organisation (DRDO), que partiu de perto de Deli a 7 de maio e voou até à zona de Port Blair, nas Andamão. O transponder foi desligado ao aproximar-se da área, só sendo reativado no regresso. Dados de navegação marítima indicam que várias embarcações civis saíram de Port Blair, mas nenhuma seguiu para Myanmar — sugerindo o uso de meios navais sem registo público.
PARADEIRO INCERTO
Segundo relatos telefónicos, os deportados foram vendados, ameaçados por homens armados e obrigados a saltar para a água perto da costa, com os mais velhos em particular dificuldade. Acabaram por chegar à região de Tanintharyi, no sul de Myanmar, em plena guerra civil, onde foram acolhidos não pelo exército, mas por um grupo armado local anti-junta. O seu paradeiro e segurança permanecem incertos.
A Índia nunca assinou a Convenção da ONU sobre Refugiados e tem endurecido a retórica contra os rohingya, classificados pelo Governo como “infiltradores ilegais”. O ministro da Administração Interna, Amit Shah, tem prometido a sua expulsão. Em maio, o ministério deu 30 dias para verificar documentos de pessoas suspeitas de serem migrantes de Bangladesh ou Myanmar.
Especialistas e relatores da ONU, como Tom Andrews, denunciaram o caso como uma “violação grave do direito internacional” e um “atentado contra a dignidade humana”. Advogados indianos tentaram levar o caso ao Supremo Tribunal, mas a instância disse não ter provas suficientes e adiou a decisão sobre se os rohingya devem ser reconhecidos como refugiados.
Paralelamente, outros 103 rohingya foram “empurrados” para o Bangladesh na mesma data. Tanto em Myanmar como no Bangladesh, as famílias vivem em incerteza e medo, conscientes de que os rohingya continuam a ser o grupo mais perseguido do país.
Em Nova Deli, Mohammad Ismail permanece cercado pelos pertences que comprou para o casamento da filha, incapaz de compreender como a Índia, que julgava ser o seu refúgio, acabou por entregar Asma novamente ao país que tentou exterminar o seu povo.
Com Madre Media e CNN Internacional