Marina Ovsyannikova, a jornalista que, em março de 2022, interrompeu o principal noticiário da televisão estatal russa para protestar contra a guerra na Ucrânia, foi adicionada à lista nacional de “agentes estrangeiros”.
Numa reação à notícia, a russa disse estar “feliz” que os “modestos méritos na luta contra o regime tenham sido tão bem avaliados”.
“É um bom motivo para reativar as minhas redes sociais um pouco esquecidas e começar a escrever novamente. É preciso justificar de alguma forma um título tão honroso”, disse, acrescentando que é “absolutamente indiferente às leis canibais” da Rússia.
“Elas não afetam de forma alguma a minha nova vida na França”, atirou.
Além da jornalista, o Ministério da Justiça da Federação Russa incluiu na lista Grigory Amnuel, também jornalista, Maria Solenova, ex-deputada municipal e o projeto online I NEWS.
Ovsyannikova ganhou notoriedade em março de 2022, pouco tempo após o início da invasão russa da Ucrânia, por ter interrompido um noticiário do Canal 1, o principal canal de televisão estatal, para protestar contra a guerra.
A 14 de março, a jornalista entrou no estúdio de televisão durante o noticiário Vremya (Tempo), mostrando, atrás da ‘pivot’, um cartaz com a mensagem: “Não à guerra. Ponham fim à guerra. Não acreditem na propaganda. Aqui, estão a mentir-vos. Russos contra a guerra”.
Em seguida, foi detida pela polícia e, posteriormente, libertada. Viria a ser multada dias depois em 50 mil rublos (cerca de 460 euros) por descredibilizar as Forças Armadas.
A jornalista decidiu, então, fugir da Rússia com a filha para um país europeu não especificado, sabendo-se agora que está em França.
Um ano depois, em outubro de 2023, Marina Ovsyannikova foi condenada a oito anos e meio de prisão à revelia por ser considerada de culpada de “espalhar informações deliberadamente falsas sobre as forças armadas russas”.
O QUE SÃO “AGENTES ESTRANGEIROS”
A lei dos “agentes estrangeiros” foi criada em 2012 para classificar as ONG que as autoridades consideravam estarem envolvidas em “atividades políticas” e que recebiam fundos estrangeiros, mas em 2017/2018 foi alargada aos meios de comunicação social e em 2020 a pessoas que alegadamente tenham atividade política.
Uma nova versão de 2022 compilou e tornou a lei ainda mais abrangente, passando a incluir pessoas ou entidades que recebam “apoio do estrangeiro” ou que estejam sujeitas “a influência estrangeira”.
A regulamentação obriga as entidades a incluir em todas as suas publicações a menção de que são “agentes estrangeiros”, impede-as de participar em eleições e de se dedicarem ao ensino, além de proibir-lhes o acesso ao público jovem.
Além disso, ficam também excluídas de quaisquer receitas publicitárias e passam a ter sanções que são “manifestamente desproporcionadas”, em caso de incumprimento.
No ano passado, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) condenou a Rússia pela sua lei sobre “agentes estrangeiros”.
“A legislação russa sobre ‘agentes estrangeiros’ é arbitrária e dá origem a um clima de desconfiança”, declarou o tribunal, após queixas de 107 organizações não-governamentais (ONG), meios de comunicação social e membros da sociedade civil russa.
A decisão dos juízes, que foi unânime, concluiu que a lei se destina a “punir e intimidar” indivíduos e organizações, referiu o tribunal situado em Estrasburgo (França), acrescentando que o seu único objetivo é ter “um efeito dissuasor” junto da população”.