A vigilância das grávidas de baixo risco que não têm médico de família passa a ser assegurada nos centros de saúde por enfermeiros especialistas em saúde materna e obstétrica (EESMO). A medida, defendida pela Ordem dos Enfermeiros, foi confirmada pelo presidente da Comissão Nacional da Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente, Alberto Caldas Afonso, ao jornal Público.
A ministra da Saúde, Ana Paula Martins, tem insistido nesta solução, sublinhando que pode contribuir para reduzir o número de mulheres que chegam às urgências sem qualquer acompanhamento durante a gestação.
Num discurso na Maternidade Alfredo da Costa, em Lisboa, a governante lembrou que, ao tomar posse em abril de 2024, sabia que para manter os bons indicadores na área materno-infantil teria de reforçar as equipas de obstetrícia e apostar também “no acompanhamento das grávidas de baixo risco nos cuidados de saúde primários, quer através dos médicos de família, quer através dos enfermeiros especialistas com base em protocolos, sempre que a utente não tem médico de família”.
Na audição parlamentar sobre os constrangimentos nas urgências de obstetrícia da península de Setúbal, a ministra criticou anteriores governos por deixarem na gaveta reformas que poderiam ter sido aplicadas há duas décadas.
“Parte destas reformas está numa gaveta há 20 anos, chama-se a ‘gaveta das reformas’”, afirmou, referindo-se à falta de publicação de normas que já regulavam o trabalho dos EESMO.
O presidente da Comissão Nacional da Saúde da Mulher confirmou que este é “o caminho a seguir” e adiantou que a orientação da Direção-Geral da Saúde sobre gravidez de baixo risco, revista em janeiro de 2024, será ajustada para incluir os cuidados de saúde primários.
Segundo dados da Ordem dos Enfermeiros, existem 3476 EESMO em Portugal, a maioria no Serviço Nacional de Saúde. Já os números da Ordem dos Médicos apontam para 1960 ginecologistas e obstetras inscritos, mas apenas 748 a trabalhar no SNS. Perante esta disparidade, a Ordem dos Enfermeiros propôs que os especialistas de enfermagem assumam as grávidas sem médico de família, acompanhando os casos de baixo risco e referenciando os de risco para os hospitais.
DÚVIDAS
A proposta, no entanto, não reúne consenso. O bastonário da Ordem dos Médicos, Carlos Cortes, disse ter “muitas dúvidas” sobre esta solução e recordou que já existem orientações da Direção-Geral da Saúde que permitem aos EESMO acompanhar gravidezes de baixo risco e realizar partos em segurança.
“Há soluções que já existem e não estão a ser aplicadas em todo o país”, sublinhou, alertando ainda para o crescimento dos partos em casa e para o aumento de grávidas não acompanhadas ou seguidas por pessoas não qualificadas. Só este ano já foram registados 103 partos em casa, contra 144 em 2024.
Também a ministra Ana Paula Martins manifestou preocupação com este fenómeno, frisando que “um parto em casa nunca é seguro”.
O bastonário da Ordem dos Médicos, por sua vez, anunciou que vai reunir com os colégios de ginecologia e obstetrícia e de medicina geral e familiar para avaliar soluções alternativas a apresentar ao Ministério da Saúde.